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O Silêncio

Sidney Jorge • 30 de novembro de 2022

O Silêncio

     "O silêncio é o mais perfeito arauto da felicidade. Eu estaria pouco feliz se pudesse dizer o quanto." , de William Shakespeare. Silêncio, arauto da felicidade. Arauto, nos tempos antigos, eram aqueles que tornavam públicas as notícias relativas aos reinos. Podemos entender como predecessores do anúncio de uma notícia. O silêncio, como perfeito arauto da felicidade, traz um significado profundo e abrangente da concepção de estar feliz. Uma frase, uma máxima ou um aforisma que produz belas reflexões, normalmente vem de uma intuição vivida ou percebida em experiências da vida, estudos, pesquisas e inflexões da própria pessoa autora na experiência do silêncio.


     Como já disse, a tomada de consciência traz-nos um olhar mais apurado para as coisas, inclusive para compreender melhor as tais frases. O que pode anteceder a nossa felicidade é o silêncio, ele é um sinal de que estamos no caminho certo. Quando percebemos estar em profundo silêncio, vivendo em sintonia com o fluxo do universo, estamos contemplando os efeitos de níveis de consciência mais elevados como por exemplo, a ALEGRIA cuja emoção é a felicidade. Permanecer em silêncio não quer dizer se calar, não é apenas isso. É de fato, criar condições de relaxamento, meditação, oração, reflexão, mas, entendo que é, sobretudo, silenciar a mente, os sentimentos que nos aprisionam, as culpas, os juízos preconceituosos, as preocupações, as reclamações, os gritos, os desânimos, a desconfiança de nosso potencial. Silenciar é mergulhar na dimensão do mar das possibilidades e encontrar a felicidade. Silenciar é perceber plenamente a condição de SER, SENDO, fluindo, caminhando, observando, colhendo e acolhendo, percebendo, significando e ressignificando, pois na vida nova os significados são renovados também. Silenciar é estar em constante exercício de soltar, de deixar ir as sensações negativas depois de compreendê-las no âmbito dos mais altos níveis de consciência.


     Silenciar não é apenas deixar-se calar, se omitir de algum posicionamento em relação às dinâmicas da vida, das injustiças, das violências, das posturas equivocadas na promoção do bem comum ou aquela referência ao dito popular: quem cala consente. Trata-se do silenciar meditativo, reflexivo, contemplativo que tende a inspirar algo a ser pronunciado ou não ou, aguardar o momento mais adequado para exercer o ato da fala, da comunicação e sobretudo do diálogo.


     O silêncio permite ouvir a si e às outras pessoas. É atencioso e acolhedor quando alguém se deixa silenciar para escutar o outro, de verdade, sem recorrer aos julgamentos e crenças para enquadrar as falas e as respostas. Hoje, mais do que nunca, seria agradável e edificador conseguir ouvir nossos interlocutores dessa forma pura, não sabemos se é mais possível ao notar que a atitude mais corriqueira das pessoas é alcançar o celular durante uma conversa quando os sinais de notificação interrompem intermitentemente os diálogos. Até mesmo em uma mesa de refeição da sala de jantar ou de um restaurante é possível notar, em algum momento, todas as pessoas dedicadas atentas a olhar seu smartphone deixando passar a oportunidade de saborear, também, aquele presente. Lógico que o aparelho faz parte do cotidiano, universifica a comunicação, é, inclusive, um instrumento de trabalho, entretanto, às vezes o que de fato ocorre é um eterno “arrastar para cima” nos jogos ou redes sociais.


     Lembro de um tempo na infância e juventude em que passeávamos na casa do avô paterno na zona rural e, à noite ao chegar das atividades das roças de milho e feijão, os tios, primos e avós se reunião para jantar enquanto partilhavam as aventuras do dia, os planejamentos e, a presença das visitas era sempre um motivo para uma boa prosa. Em dado momento o avô, que passava a maior parte do tempo em silêncio ouvindo tudo e a todos, raspava sutilmente a garganta e os presentes, entendendo que ele pretendia dizer alguma coisa, silenciavam-se e ouviam atentos a mensagem.


     Atualmente, nos encontros das famílias, normalmente testemunhamos na verdade, é a disputa das falas, entre as pessoas, entre o volume alto do som com músicas, às vezes, de mensagens e frequências ruins  e celulares. Um conflito de realidades e de dimensões uma vez que os tais aparelhos são espelhos da virtualidade. Parece que estamos próximos quando, de fato, estamos nos distanciando, nos estranhando e aos poucos deixando de lado oportunidades únicas de convivência. Há inclusive pesquisa sobre isso: de acordo com pesquisadores de psicologia da Universidade da Colúmbia Britânica, as pessoas que se concentram em seus smartphones enquanto compartilham uma refeição com seus amigos ou familiares tiveram uma experiência pior do que pessoas que não levaram o celular para a mesa. 2  Sem radicalismos e moralismos, seria interessante as famílias combinarem um dia para se encontrar, que fosse por uma hora, para se colocarem diante uma mesa de jantar, deixando os celulares de lado e, ao som de uma música agradável no volume mais baixo e ver o que acontece. Certamente, no início ficaria estranho, mas poderia criar uma nova forma de conviver e ver a realidade da própria família sob um exercício de saber ouvir, falar e silenciar.


     A pessoa feliz não carece de ficar dizendo que está feliz. É o que apresenta a segunda parte da frase de Shakespeare, “Eu estaria pouco feliz se pudesse dizer o quanto”, o quanto o silêncio precede a felicidade. Os barulhos da mente, da alma impedem a experiência da verdadeira condição de felicidade. Creio eu que dizer, verbalizar, falar, gritar o quanto se está feliz quebra o silêncio e, ao quebrá-lo implica afastá-lo de sua função de ser o arauto, o mensageiro da felicidade. Talvez a felicidade não seja para ser falada e sim, silenciosamente expressada.


     O convite é para valorizarmos o silêncio, os momentos de silêncio, silenciar a mente e a alma, deixar ir, os apegos barulhentos, deixar vir, os benefícios do fluir silencioso que antecede a felicidade. No silêncio contém o mistério tão efetivo para se ouvir a voz de Deus.


Referências:


1 - https://www.pensador.com/frase/MzgyNzM/#:~:text=O%20sil%C3%AAncio%20%C3%A9%20o%20mais%20perfeito%20arauto

%20da%20felicidade.,barulho%20por%20nada%20(1623).


2 -  https://sensorialbr.com/jantar-com-o-celular/ - acesso em 30/11/2022

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