"O essencial é invisível aos olhos".

Sidney Jorge • 26 de abril de 2023

     "O essencial é invisível aos olhos"

     Eis uma frase repetida inúmeras vezes pelo mundo afora: “só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos.” Ganhou repercussão através das páginas do livro: O Pequeno Príncipe, com a fala da raposa quando despedia dele contando a ele o seu segredo. Interessante que a primeira edição do livro fora publicada em 1946, entretanto, a pensadora que trago para a reflexão trazia uma frase bem próxima a essa. Trata-se de Helen Keller (1880-1968) alguém que, com toda propriedade, disse o seguinte: “As melhores e as mais lindas coisas do mundo não se podem ver nem tocar. Elas devem ser sentidas com o coração.”2 A semelhança entre as frases é notada à primeira vista. Vale observar que essa máxima costuma ser atribuída a Charles Chaplin ³.


     Mas quem é Helen Keller?


     Diante a disciplina de Sociologia da Educação no curso de Ciências Sociais, discorrendo sobre a questão da linguagem, a formadora apresentou em um vídeo a sugestão do filme com o título: “O milagre de Anne Sullivan” de 1962. 4 Motivado pela indicação, assisti ao filme. Helen era uma menina que perdeu a audição e a visão aos dezenove meses de vida. Filha de Kate Adams Keller e do Coronel Arthur Keller (capitão do Exército dos Estados Confederados da América) Seus pais e irmão encontraram muita dificuldade em cuidar dela. A história mostra-a ainda criança. Caminhava batendo nos móveis e apresentava muita irritação, a comunicação mais efetiva com a família, principalmente a mãe, dava-se via pedaços de bolo que, sempre ofereciam a ela.      


     É nesse contexto que surge Anne sullivan. Uma professora com certo grau de deficiência visual que se propôs trabalhar para a família como tutora da menina. O anseio do pai era interná-la. Anne compreendeu o grande problema evidenciado pela falta de comunicação. Entendeu também a capacidade potencial de Helen. Intuiu e desenvolveu uma forma de linguagem através do toque. Percebendo a ansiedade da família com o processo, pediu para ficar isolada com a menina durante algum tempo. O pai só via que o jeito seria um internato. Conforme a propriedade era muito grande, ajeitaram uma casinha no terreno para que as duas pudessem ficar. Anne Sullivan, aos poucos, foi aumentando o repertório de sinais através do toque entre as mãos. Alfabeto e palavras foram surgindo e apreendidas pela menina. Pois bem, todo trabalho permitiu que Helen Keller desenvolvesse uma forma de linguagem para interagir com o mundo ao seu redor, sua família e amigos também aprenderam a inovadora forma de comunicação com ela.


     O fato é que Keller estudou, desenvolveu ferramentas de comunicação que se tornaram referências para outras pessoas e para o próprio sistema de ensino, “superou barreiras para conquistar um bacharelado e se tornou escritora, filósofa, conferencista e ativista pelos direitos de minorias e pessoas com deficiência. Sua história virou inclusive roteiro de filme, O Milagre de Anne Sullivan, de 1962”.5 O filme rendeu dois Oscars em 1963 às atrizes Anne Bancroft (melhor atriz) e Patty Duke (melhor atriz coadjuvante) intérpretes de Anne Sullivan e Helen Kelller respectivamente.  Helen Keller foi agraciada com o prémio Nobel da paz em 1953.7


     Lógico que as referências aqui não expressam por completo a vida, a obra, as realizações e a relevância de Anne Sullivam e de Helen Keller para a sociedade, o objetivo específico é atentar para o significado profundo que essa frase pode impactar em nós, “As melhores e as mais lindas coisas do mundo não se podem ver nem tocar. Elas devem ser sentidas com o coração. ” Ou, se quisermos, “só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos”. Sem dúvidas, a história dessas duas mulheres nesse episódio, demonstra que as coisas podem ser vistas de forma diferente, fora dos parâmetros pré-estabelecidos, aliás, as coisas podem ser sentidas de forma diferente. O grande segredo é dedicar o coração nessa missão de apreender e compreender o mundo que nos cerca e ainda, a realidade que nos cerca.


     Olhos e ouvidos menos treinados ou menos purificados pelo crivo do coração tendem a julgar que, em determinadas circunstâncias, a única opção seja a institucionalização, daquilo que não se compreende, como possibilidades de melhoras. Talvez o processo de melhora esteja em nós, na maneira como aprendemos a ver as coisas. Mas quando se vê e sente com o coração alcançamos a essência, podemos ver como Deus vê, na misericórdia e não nos preconceitos punitivistas e encarceradores dos sonhos, das liberdades. Estamos falando aqui da liberdade humana que está além das formalidades de uma sociedade que vive, infelizmente, sob as pautas do medo. As soluções apresentadas apontam comumente para a apropriação da liberdade. Há que se reconhecer o "nomos" Estatal, é o jeito da sociedade se organizar. Há que se reconhecer as responsabilidades de quem viola os princípios da convivência, leis são produtos da evolução histórica. Entretanto,  seja no âmbito do trabalho, vivemos ainda opções escravagistas na produção. Seja na escola, vivemos ainda significativos números de evasão e grande número de analfabetos funcionais. Seja nas relações, quantas notícias de cárcere privado ou psicológico e outras violações... O fruto de muita opressão só pode ser uma corrente de... mais opressão.


     Quem sabe a mudança, tal como no filme, que retrata uma história real, passe exatamente pela linguagem. Uma nova forma de se difundir a comunicação. A essência de sentimentos de ódio, raiva, mentiras, vingança que pairam nas redes sociais e nos meios de comunicação parecem só aumentar, tornando mais distantes soluções razoáveis aos problemas que a sociedade enfrenta. Misérias alheias parecem não sensibilizar mais e, talvez, nem tenham mais espaço para elas, não têm força para concorrer com a veiculação das tragédias para deleite de, infelizmente, muitas pessoas.


     Mas para comunicar a essência, a beleza das coisas em si e sobretudo o mistério da vida em plenitude com a própria Divindade, há que se recorrer aos olhos? Há que se recorrer aos ouvidos? ... Há que se recorrer ao coração, límpido, pulsante, sensível aos propósitos da fé em profundidade, do amor em comunhão. Tal exercício tornará clara a visão, a audição e todos os sentidos rumo a construção ou quem sabe, a recuperação de uma comunidade cujos valores perpassam o culto às misérias ao reconhecer, de fato, nossa imagem e semelhança com o próprio Deus. Tornar-nos-emos assim, bons ouvintes, bons enxergadores, bons oradores, boas pessoas e, bons conviventes.


     Como inspiração para a metodologia inovadora de criação de ensino, viabilização de linguagem e comunicação, e para um fato extraordinário de mudança de realidade que se tornou um sucesso a impactar a vida de inúmeras pessoas. E também, como inspiração a provocar uma renovada maneira de ver a realidade que nos cerca, vale assistir ao filme e ler um pouco da biografia de Helen Keller, escrita por ela e outros pensamentos e exemplos deixados por ela e sua pioneira educadora Anne Sullivan.


Referências:


1-     Saint-exupéry, Antoine de. O Pequeno Príncipe. 50ª ed. Rio de Janeiro, Ed Agir.2014

2-     https://www.ebiografia.com/helen_keller/

3-     https://www.pensador.com/autor/helen_keller/

4-     Filme: O milagre de Anne Sullivan. Direção Arthur Penn. 1962

5-     https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/noticia/2019/08/quem-foi-helen-keller-ativista-por-direitos-de-pessoas-com-deficiencia.html

6-    https://www.cineplayers.com/premiacoes/oscar/35

7-     https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/noticia/2019/08/quem-foi-helen-keller-ativista-por-direitos-de-pessoas-com-deficiencia.html


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