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Sobre o perdão II - "Tempo de falar."

Sidney Jorge • 22 de julho de 2021

Sobre o perdão II - "Tempo de Falar."

No texto anterior: Sobre o perdão fora proposto uma reflexão sobre o aspecto libertador do perdão contrastado ao aprisionamento oferecido pelo universo da culpa. Oportunamente e, continuando o pensamento do tema, soma-se mais um caminho para a busca da celebração do perdão tendo em vista sua importância à humanidade.


Em 1996 recebi de presente um livro chamado “A dança do tempo”² que traz reflexões profundas apoiadas no livro bíblico Eclesiastes 3, 1-8. Entre as mensagens, uma delas versa sobre o tempo de falar³ e no decurso do texto apresenta uma história que vale declinar todo seu teor para os leitores interiorizarem suas próprias visões:


 “Vou lhe contar uma história que dizem ter acontecido com um grande santo. Um homem chega tarde ao mosteiro querendo encontrar-se com o santo. Ele o atende, e com amor de irmão escuta sua dolorosa aventura. Uma alma cansada e aflita, querendo se livrar de algo feito e que não dava mais conta de conviver com ele. Disse que com suas palavras condenou toda uma cidade. Tinha interesses inescrupulosos, semeou discórdia, e a justificou quando as dizendo que o mundo é assim mesmo. O santo disse que quando as pessoas são tomadas por desejos egoístas vão sempre ferir alguém e achar natural machucar... subvertem a ordem, o errado passa a ser certo, legitimam o mal dizendo que o bem é decadente. No fundo, estão perdidas em si mesmas. Quando lhes falta a origem de cada razão, haverá sempre apelo ao contrário...


Chamando o viajante para uma volta, deu a este um grande livro. Foram até a cidade onde tudo tinha acontecido. Ventava muito naquele dia. Pediu o santo que durante a travessia daquela cidade o homem fosse rasgando em partes minúsculas as folhas do livro e as espalhasse pelas ruas por onde iam passando... sem muito compreender o pedido, assim o fez...

Cruzaram a cidade de ponta a ponta, ruas, avenidas, vielas, todos os lugares receberam a visita do dois, e o vento semeando forte, tempestivamente, os menores pedaços do livro...


Depois de muito andarem, assentaram-se, na parte mais alta da cidade, num muro de pedra, e puderam ter uma visão maior daquele lugar. O homem perguntou ao santo o porquê daquilo. Ele respondeu que ainda não havia terminado. Que o mais importante viria a seguir. O santo pediu ao homem que naquele momento voltasse para recolher cada pedaço do livro, nenhuma parte poderia se perder... assustado, terrivelmente assustado, o homem respondeu: É impossível.


Calmamente o santo começou a falar... Meu filho, da mesma forma que é impossível reconstruir o livro, o mesmo acontece com cada palavra que sai da boca. Não há quem consiga devolvê-la. Ela segue o caminho dos ventos. Inútil correr atrás, sempre estará um passo na nossa frente... Você poderá chegar em praça pública, pedir perdão, dizendo que tudo não passou de algo inventado, que tais palavras eram mentira ... ainda com tudo isso, nada será como antes. As pessoas vão dizer que onde há fumaça há o fogo. Então queimarão pessoas na fogueira das palavras. Insinuarão tanto, olhares condenando o inocente, aplaudindo os culpados.


Vejamos também num outro ângulo. Vamos imaginar que uma pessoa tenha errado uma vez e acertado outras dez. A grande maioria esquecerá numa rapidez impressionante o bem praticado. Olharão a pessoa pelo passo errado, deixando sem memória uma grande caminhada de acertos... Você pode ajudar alguém por toda a vida, mas no dia em que faltar a sua ajuda, será cobrado por tal ato... Poderá ser bom durante anos e anos , mas se falhar um segundo, isso jamais será esquecido. As pessoas irão lembrar somente do erro, esquecendo as virtudes. Poucos se recordarão do bem praticado, a grande maioria das pessoas é bem pequena espiritualmente... Além do mais, ninguém passa imune por esta vida; a fragilidade caminha como sombra no nosso calcanhar. Pelo que consta, em nenhum de nós a vida achou só graça, também encontrou fraquezas...


A palavra não pode ser devolvida à boca as partes do livro nunca mais se juntarão, mas isto não é tudo. O mundo do seu coração foi atingido, você foi humilde diante do erro. A grande vida ama os humildes, a estes concede mais um tempo e os visita com a graça do perdão...


Declinado o texto espero que possamos olhar com mais atenção às nossas palavras e a força construtiva ou destrutiva presentes nelas e, que a sabedoria permita-nos escolher pela dimensão promocional do bem em nossas falas.


Referências:


1 - Araújo, Paulo de. A dança do tempo: nossas vidas nossas perdas. 4ª edição. Petrópolis, RJ. Vozes, 1995..

2 - Idem, p. 85 a 87.

3 - Ibidem, p 85 a 87.


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